O câncer de colo de útero ou câncer cervical (CC) é o quarto tipo de câncer mais comum entre a população feminina do mundo, estando atrás do câncer de mama, colorretal e pulmão. Em 2018, houve aproximadamente 570 mil casos e são cerca de 311 mil mortes anualmente.
A incidência estimada foi de 13,1 por 100.000 mulheres em todo o mundo, sendo importante evidenciar que as incidências de câncer de colo de útero são distribuídas desproporcionalmente entre países desenvolvidos e países emergentes.
As taxas de incidência e mortes em países desenvolvidos têm diminuído progressivamente devido a programas de rastreamento de câncer e programas de vacinação contra o HPV financiados por enormes orçamentos governamentais.
Em países emergentes, no entanto, o câncer de colo de útero ainda é um dos cânceres mais prevalentes e a principal causa de morte por câncer em mulheres – muitas das quais são frequentemente diagnosticadas em uma idade em que ainda estão constituindo famílias. A média mundial de idade no momento do diagnóstico foi de 53 anos e a média no momento da morte foi de 59 anos.
Na China, observa-se uma tendência significativamente crescente de incidência e mortalidade por câncer de colo de útero, especialmente em mulheres jovens, se tornando o segundo câncer feminino mais comum e a terceira principal causa de morte por câncer em mulheres chinesas de 15 a 44 anos. Na Índia, o câncer de colo de útero é a segunda principal causa de câncer em mulheres. Estima-se que um quarto das mortes por CC a cada ano ocorram no segundo país mais populoso do mundo.
Vale ressaltar que nos últimos anos, devido à falta de métodos eficazes de prevenção/rastreamento, a incidência de câncer de colo de útero ainda está aumentando nos países emergentes.
O câncer de colo de útero no Brasil
No Brasil, o câncer de colo de útero segue a tendência mundial de ocorrência em países emergentes, sendo responsável por cerca de 5,33 óbitos/100 mil mulheres em 2019 e, segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA) a estimativa é que para o triênio 2020/2022, sejam diagnosticados 16.590 novos casos de câncer, com um risco estimado de 15,43 casos a cada 100 mil mulheres.
Sem considerar os tumores de pele não melanoma, observamos a taxa de casos por 100 mil mulheres distribuídos pelas regiões do Brasil:
Região | Taxa anual |
Região Norte (segundo tipo de tumor mais frequente) | 21,20/100 mil |
Região Nordeste | 17,62/100 mil |
Região Centro Oeste | 15,92/100 mil |
Região Sul | 17,48/100 mil |
Região Sudeste | 12,01/100 mil |
O papilomavirus e os fatores de risco
O câncer de colo de útero é causado pela infecção persistente por alguns tipos de papilomavirus humano de alto risco (hrHPV), assim como início precoce da atividade sexual, múltiplos parceiros, idade, tabagismo (a doença está diretamente relacionada à quantidade de cigarros fumados), parto, uso de contracepção oral e dieta. Entre esses vários fatores de risco a infecção persistente pelo hrHPV parece ser o principal fator de desenvolvimento do câncer de colo de útero. A infecção genital por esse vírus é muito frequente e, geralmente não causa doença na maioria das vezes.
Pesquisas epidemiológicas mostram que em mulheres sexualmente ativas, a taxa de infecção viral pode chegar a 80%. Enquanto a maioria das infecções virais é eliminada espontaneamente pela imunidade do hospedeiro, poucas persistem e eventualmente causam câncer. Assim, o câncer de colo de útero é um acidente raro em infecções comuns por hrHPV.
As cepas de hrHPV são responsáveis por mais de 90% dos CC, são o HPV 16 e 18. Até o momento, há um total de 15 cepas de hrHPV identificados, e sete dessas cepas (HPV 16, 18, 31, 33, 45, 52, 58) são cobertos pela vacina contra o HPV disponível. Atualmente, não há tratamento eficaz para a persistência do HPV.
Prevenção e diagnóstico
Nos estágios iniciais, o desenvolvimento de câncer de colo de útero associado ao hrHPV é assintomático. O hrHPV pode permanecer não detectado se não for rastreado em tempo hábil e manifestar transformação oncogênica levando ao desenvolvimento de câncer de colo de útero. Essas alterações são descobertas facilmente no exame preventivo (conhecido também como Papanicolaou) e são curáveis na quase totalidade dos casos.
A prevenção do câncer de colo de útero relacionado ao HPV depende de vacinas contra o HPV caras e exames repetidos do colo do útero. Embora as vacinas tenham mostrado resultados promissores nos últimos anos, a implementação de estratégias universais de vacinação contra o HPV é cara para países emergentes, especialmente para países populosos como China e Índia, e as vacinas multivalentes não podem cobrir completamente todos os principais tipos de infecções por HPV nesses países.
No Brasil existe o programa de vacinação para crianças, onde são aplicadas duas doses com intervalo de 6 meses. A população alvo prioritária são meninas na faixa etária de 9 a 14 anos e meninos de 11 a 14 anos com vacina de recuperação até os 26 anos para aqueles que não foram vacinados e, em caso de decisão compartilhada entre o médico e a paciente, a vacina pode ser aplicada até os 45 anos.
Além disso, todas as vacinas comercialmente disponíveis são profiláticas e não têm efeitos terapêuticos nas infecções existentes. Para pacientes infectados pelo HPV não vacinados que ainda estão em risco de câncer de colo de útero, triagens repetidas e biópsias dirigidas por colposcopia são realizadas. Consequentemente, essas intervenções deram origem a um potencial tratamento excessivo, custos adicionais, ansiedade do paciente e efeitos adversos (por exemplo, sangramento vaginal e função sexual prejudicada).
Questão de saúde pública global
Devido ao enorme ônus econômico imposto pelos programas de rastreamento e vacinação, muitas mulheres ainda estão desprotegidas contra infecções por HPV. Contudo, a situação é pior em países com menos recursos econômicos ou menores índices de investimento em saúde pública, pois a população tem menos acesso a programas de prevenção e tratamento.
A Organização Mundial de Saúde (OMS) criou em 2020 a Estratégia Global para a Eliminação do câncer de colo de útero, endossada pela Assembleia Mundial de Saúde, que pede que 70% das mulheres e, todo o mundo sejam examinadas regularmente para doenças cervicais com um teste de alto desempenho e que 90% delas precisam receber tratamento adequado.
Juntamente com a vacinação de meninas contra o hrHPV, a implementação dessa estratégia global poderia prevenir mais de 62 milhões de mortes por CC nos próximos 100 anos.
A nova orientação inclui algumas mudanças importantes nas abordagens recomendadas pela OMS para o rastreio de câncer de colo de útero. É recomendado um teste de HPV baseado em DNA (teste de HPV-DNA) como o método padrão, em vez de inspeção visual com ácido acético (VIA) ou citologia (Papanicolau), atualmente os métodos mais comumente usados mundialmente para detectar lesões pré-cancerosas. Esse teste é uma ferramenta com diagnóstico objetivo, não deixando espaço para dúvidas no processo de interpretação dos resultados, além de ser mais simples e prevenir mais pré canceres e cânceres e, portanto, salvar mais vidas do que a inspeção visual ou citologia, além de ter melhor custo efetivo e permitir a auto coleta em ambiente domiciliar.
A relação entre HIV e HPV
A infecção pelo HIV leva a uma diminuição da resposta imune, facilitando assim o aparecimento de outras infecções, sendo uma das mais importantes o HPV. As alterações na imunidade mediada por células facilitam a aquisição de infecções oportunistas e limitam a capacidade do organismo de produzir uma resposta imune eficiente, propiciando dessa maneira a infecção envolvendo outros tipos de HPV (infecção múltipla ou coexistência de 2 ou mais tipos de HPV), que como o vírus não pode ser eliminado, aumenta a persistência da infecção pelo HPV.
A prevalência de displasia leve em mulheres imunocompetentes não excede 27%, enquanto que pode chegar a 80% em mulheres HIV positivas: a imunossupressão neste último grupo implica no desenvolvimento de lesões mais agressivas e menor resposta ao tratamento, além de levar ao aparecimento de lesões pré-cancerosas em cerca de 60% das mulheres que sofrem de infecção pelo HPV, que evolui em menos de 3 anos. Isso resulta em um risco seis vezes maior de desenvolvimento da doença.
Para as mulheres que vivem com HIV é importante ressaltar que o rastreamento primário por teste de HPV-DNA, seguido por um teste de triagem se os resultados forem positivos para HPV, tem o intuito de avaliar os resultados quanto ao risco de câncer de colo de útero e necessidade de tratamento. As recomendações mundiais também orientam que o rastreio comece mais cedo (aos 25 anos) e não aos 30 anos, como ocorre atualmente.
As mulheres portadoras de HIV também devem ser testadas frequentemente em intervalo menor de tempo após o tratamento do que as mulheres sem HIV.
Sinais e sintomas de câncer de colo de útero
O câncer de colo de útero é uma doença de desenvolvimento lento que pode não apresentar sintomas em fase inicial. Nos casos mais avançados, pode evoluir para:
- Sangramento vaginal intermitente (que vai e volta).
- Sangramento menstrual mais prolongado que o habitual.
- Sangramento vaginal após relação sexual.
- Secreção vaginal anormal.
- Dor abdominal associada a queixas urinárias ou intestinais.
- Sangramento após menopausa.
- Dor durante a relação sexual.
- Dor na região pélvica.
Em caso de doença avançada, os sinais e sintomas podem incluir:
- Inchaço nas pernas.
- Problemas ao urinar ou evacuar.
- Sangue na urina
Taxa de Sobrevida
A porcentagem de mulheres que vivem pelo menos 5 anos após o diagnóstico da doença é alta se houver o diagnóstico precoce, assim como o tratamento. Em casos em que não ocorre o rastreio adequado e anualmente, ou quando o diagnóstico ocorre em estágio avançados da doença, a taxa de sobrevida diminui, podendo chegar a 17%, o que mostra a importância dos exames preventivos.
Saiba mais sobre o câncer de colo de útero
Referências
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